Trecho de trabalho originalmente publicado na Revista Caiana, número 5.
Em: http://caiana.caia.org.ar/template/caiana.php?pag=articles/article_1.php&obj=158&vol=5
O
trabalho O
Sermão da Montanha: Fiat Lux6,
de Cildo Meireles, como muitos dos trabalhos desse artista, já foi
bastante analisado e estudado pela historiografia da arte no Brasil.
Ele se configura como uma das ações desse artista que promoveram
grande impacto no campo da arte brasileiro do período, tornando-se
uma importante referência para a compreensão de práticas
artísticas críticas em um momento político e cultural conflituoso
no país. Diante das várias perguntas já feitas a esse trabalho de Meireles,
acredito que ainda se possa fazer mais uma: como essa obra pode
revelar uma prática de Crítica Institucional em um contexto
cultural, artístico e político latino-americano e brasileiro?
Fiat
Lux
é uma obra que, para se realizar, necessitava do espaço da
instituição onde está inserido. Realizado pela primeira vez em 25
de abril de 1979, no Centro Cultural Cândido Mendes, Rio de Janeiro,
a obra consistia de um cubo formado por 126 mil caixas de fósforos
empilhadas, cercada por oito espelhos em cuja superfície se podiam
ler oito passagens do sermão da montanha (Mateus 5, 3-10), tudo isso
sobre uma espécie de “tapete” de lixa negra. Participavam,
ainda, cinco atores os quais atuavam como seguranças que circulavam
o tempo todo ao redor da obra, cujos passos sobre a lixa soavam como
fósforos sendo riscados (o som dos pés na lixa foi gravado e
amplificado). A exposição durava somente 24h.
O
projeto original de Fiat
Lux data
de 1973, mas o trabalho só foi realizado seis anos depois. Três
tentativas anteriores de montagem dessa obra foram malogradas. A
primeira foi em São Paulo, em 1973, em uma galeria privada, mas foi
cancelada três semanas antes da inauguração de maneira inesperada.
O caso se repetiu no Rio, em 1975, quando outra galeria privada
também cancelou a exposição. Em 1978, a mostra foi novamente
cancelada, desta vez por conta de um incêndio no MAM do Rio, onde
seria realizada.
As
tentativas malsucedidas de expor Fiat
Lux
já revelam um pouco do impacto institucional que este trabalho
provocou. Num momento de ditadura, em que as censuras e os boicotes
aconteciam a todo momento, tornava-se temerário para as galerias
privadas apoiar determinados tipos de ações artísticas.
Arriscar-se a serem fechadas ou proibidas de trabalhar era algo que
algumas não aceitavam muito facilmente. E o medo se justificava pelo
que acontecia às instituições que assumiam o risco de realizar
exposições com a produção crítica da época: eventos eram
cancelados (a exemplo da Bienal da Bahia, fechada em 1968) e mostras
eram boicotadas (como a exposição da pré-Bienal de Jovens de
Paris, com a representação brasileira que foi impedida de
participar do evento, em 1969).
Levando
em consideração esse contexto institucional-político do Brasil da
época, é possível dizer que a obra Fiat
Lux
é uma prática de Crítica Institucional. E o fator principal para
esta afirmação está na necessidade do espaço da galeria que o
trabalho exige para acontecer. Quando o artista afirma que somente no
interior de uma galeria é possível a realização e compreensão de
Fiat Lux, vem
à tona também sua pretensão de jogar com os sentidos desse lugar,
revelando e pondo em questão compreensões sobre este espaço. A
galeria não é um lugar neutro, mas sim um lugar de concentração
de tensões que, a qualquer momento, podem explodir, assim como o
cubo de caixas de fósforo no centro do espaço expositivo que
funciona quase como um reflexo do mesmo. Ou seja, para Cildo
Meireles, a galeria não está distante do mundo, não compõe um
lugar sacro e, por isso mesmo, deve ser contaminada por toda a sorte
de tensões políticas que se desenrolam do seu lado de fora. Quando
Meireles leva o explosivo pra dentro da galeria, parece revelar o que
tem de explosivo dentro dela mesma também.
Ao se tentar comparar esse trabalho com outros realizados por
artistas europeus e estadunidenses
no mesmo período, é possível estabelecer semelhanças com essas
práticas. Mas também existem diferenças importantes de contexto
(que geraram distintos modus operandi) que é preciso serem
analisadas.
No
caso de Momma
Poll,
trabalho de Haacke aqui brevemente analisado, poderíamos começar
observando as semelhanças com Fiat
Lux. Pra
começar, o trabalho de Haacke tem uma relação direta e necessária
com a instituição para se realizar. Assim como em Fiat
Lux, antes
de querer distanciar-se para criticar, negar para afirmar outra forma
de prática artística crítica possível, o trabalho se insere na
instituição, a escava desde dentro. Estabelece uma espécie de
relação de necessidade com esta para poder existir e operar o seu
questionamento.
Porém,
a relação de Momma
Poll
com a instituição onde está inserida é muito mais simbiótica.
Este trabalho existe para esta e nesta instituição. Já o de Cildo
Meireles é uma obra que pode ser replicada em outras instituições,
pois não lida com questões institucionais tão específicas. Em
Fiat
Lux,
não se trata de uma crítica à galeria y ou z que o expõe. Se
trata mais de entender o espaço expositivo,
tomá-lo como componente do trabalho e da crítica, inseri-lo em um
contexto político, mais do que desnudá-lo.
Observando
essa diferença inicial entre Haacke e Meireles, já podemos
depreender algumas distinções gerais entre práticas institucionais
no Brasil e nos Estados Unidos durante o período dos anos 1970. A
primeira delas pode se situar no próprio desenho institucional no
campo da arte brasileiro da época. Enquanto na Europa, os museus
modernos emergem já no século XIX, acompanhando toda uma série de
mudanças epistemológicas que atingiram desde a ciência, passando
pela religião e chegando às artes; os Estados Unidos começaram
mais tardiamente, no início do século XX a compor as suas
instituições, especialmente as de arte moderna. Porém, este país
se afirmou como potência econômica muito cedo neste século e suas
instituições artísticas foram fortalecidas e estruturadas como
suporte para uma expansão imperialista pelo mundo. E é no bojo
dessa expansão que algumas das instituições de arte moderna surgem
no Brasil.
Sendo
assim, com instituições jovens (algumas com apenas 20 anos no
período dos anos 1970), algumas galerias, o circuito institucional
do Brasil, especialmente os de arte moderna, ocorriam basicamente
através dos eventos: os salões de arte, as bienais e as exposições
(algumas delas promovidas pelos próprios artistas), principalmente.
Estes eram os grandes validadores e legitimadores da produção
artística. Nos anos 1970, há uma certa ampliação de espaços
expositivos, instituições e mostras são produzidas com frequência
nesse período. Porém, diferente do contexto institucional
estadunidense e europeu, fortemente constituído e instituído a
ponto de funcionar como instância reguladora, nomeadora,
legitimadora e reprodutora de discursos artísticos, a malha
institucional brasileira, por sua precariedade, estava por fazer-se.
A luta era por constituição, por formação e fortalecimento dessas
poucas instituições. Desse modo, a relação que se estabelece
entre os artistas e essas instituições se dá em níveis distintos.
As vezes, o ataque mira o sistema político mais amplo, tendo a
instituição como vitrine. Outras vezes, se questionam os sistemas
de seleção e legitimação dos eventos (salões, bienais, etc) e o
ataque acontece mais diretamente, voltado para as práticas
institucionais definidoras desses esquemas.
Porém,
no caso de Fiat
Lux, não
dá tampouco pra dizer que o artista, simplesmente, usou a galeria
como vitrine para uma ação crítica. A operação é muito mais
complexa que isso. Mesmo sem fazer um ataque à galeria diretamente,
o trabalho estabelece uma relação complexa com o espaço expositivo
e o contexto político que traz à tona a partir dos elementos que
põe em jogo no trabalho.
Questões
de composição são pensadas e calculadas pelo artista que, além do
fator performático, também leva em consideração a dimensão da
construção estética do objeto (mesmo que seja efêmero). As 126
mil caixas de fósforos não estão dispostas de forma aleatória.
Elas estão reunidas de maneira a formar um cubo, o qual foi colocado
intencionalmente na parte central do espaço expositivo. Como uma
ironia ao projeto construtivo brasileiro, Meireles pensa
geometricamente seu objeto, o dispõe de maneira exata no centro da
galeria, mas tudo está composto por fósforos, material ordinário e
precário. Além do mais, a “escultura” é um material explosivo
extremamente potente. Junto com todos os outros elementos do
trabalho, esta composição se torna objeto de contemplação e medo,
de interesse e repulsa por parte do público.
Segundo
Meireles, sua ideia era fazer um cubo dentro do cubo (o “cubo
branco”, o local da exposição) e essa repetição daria uma
impressão de espelhamento de um pelo outro. Além do mais, um cubo
inserido em outro parece passar, também, uma sensação de
aprisionamento, sufocamento com potencial de explosão. Como afirma
Meireles em depoimento ao crítico Felipe Scovino7
(2009): “para explodir, você, primeiro, tem que compactar,
condensar, reprimir.
Enfim, você tem que pressionar. Mas a ideia é toda esta: de
condensar e levar o exterior para o centro”.
Segundo
ainda Scovino, Meireles calculou exatamente a quantidade de fósforo
utilizada na composição do cubo e reuniu um número de caixas de
fósforos suficiente para explodir a galeria, caso fossem acesos. A
iminência dessa explosão é ressaltada pelo artista através dos
outros elementos que compõem a mostra: os cinco atores vestidos de
segurança que circulam em volta do cubo, caminhando por sobre o
tapete de lixa que faz soar cada passo dado sobre si como um fósforo
sendo riscado. A amplificação desse som aumenta a angústia e a
tensão provocadas pelos atores. Estão acedendo o fósforo? Não
estão? Eles estão fazendo a segurança, mas ao mesmo tempo estão
provocando o risco de explodir tudo?
Essa
composição põe em questão todo um jogo de tensões e medo dentro
do espaço da galeria que está para além dela. O cubo de fósforos
é uma alegoria do capital (a ideia de acúmulo pelo acúmulo que
pode levar à destruição) e é também uma alegoria política
bastante forte (a repressão, condensada, que leva à explosão). E
todo o trabalho, essa composição objetual e performática, se torna
uma metáfora do contexto de medo e insegurança que passa a adentrar
o espaço distanciado e neutro da galeria. Os atores que fazem a
“segurança” do cubo de fósforos, parecem policiais à paisana e
tanto sua postura, olhar, vestimentas, movimentos, parecem provocar
ainda mais a sensação de medo. Num período de ditadura, a polícia
assusta, provoca pânico, representa o braço armado e cruel do
estado repressor que entrou em voga. Porém, esses medos e angústias,
quando em grande número e pressionados por uma força grande, tendem
à explosão. É preciso reprimir para explodir, disse Meireles. A
repressão estava grande. Esperava-se agora pela explosão.
Este
trabalho de Meireles também coloca em questão os limites entre
legalidade e ilegalidade. Uma caixa de fósforo é um objeto que
possui pólvora, elemento explosivo que possui a potência do perigo
e da explosão, mas que em uma quantidade reduzida é permitida e
utilizada por todos. Colocadas em grande número reunido, possui um
potencial de explosão que pode levar à morte, mas quem legisla
sobre a quantidade de caixas de fósforos que alguém pode adquirir?
Se a um cidadão comum não é permitido o acesso a artefatos
explosivos, a bombas, nem a armas de fogo, quem o impede de comprar
fósforos? Que lei proibia o artista de reunir em uma galeria 126 mil
caixas de fósforos e pôr em risco a vida das pessoas que fossem ver
a mostra? Se está vedado ao cidadão o acesso ao armamento, a
produção de uma arma através do acúmulo de elementos ordinários
é um ato ilegal ou legal? Segundo Scovino, “o objetivo do artista
não
é criar um impacto visual pela quantidade, mas usar este fator
quantitativo para alterar funções, criar novas metáforas, reverter
significados: porque sozinha a caixa de fósforos é um objeto banal
e corriqueiro, de tal maneira integrado ao nosso cotidiano”
(2009:14).
Essa
ironia colocada em movimento provoca um outro ruído institucional –
na instituição jurídica, no conjunto das práticas e discursos que
definem o legal e o ilegal no interior do social. Ao transformar algo
legal em potencialmente criminoso, Meireles ironiza a arbitrariedade
dos sistemas de definição do que é ou não é criminoso. Nesse
sentido, esse trabalho realiza uma prática de Crítica
Institucional, considerando as dimensões políticas e ideológicas
gerais que compõe tanto as instituições sociais quanto as
artísticas também, a qual, a partir dos anos 1980, passa a ser
realizada pela já mencionada segunda geração. Ampliando a noção
de instituição, as ações dos artistas desse período, como já
dito, miram não apenas os museus, mas os conjuntos discursivos e de
práticas sociais que incidem sobre o social e sobre a arte também.
E como já mencionado antes também, quando nos Estados Unidos e
Europa essas questões vão ser mais evidenciadas posteriormente, nos
anos 1970 as práticas latino-americanas já as colocavam em questão,
visto o contexto repressivo político em que estavam mergulhadas.
Ao
afirmar isso, não quero dizer que, necessariamente, houve uma
vanguarda brasileira (e latino-americana) em relação às questões
críticas ou ao entendimento de instituição como os conjuntos de
práticas e discursos que conformam, definem e estruturam a vida
social geral. Já nos anos 1970, artistas como Hans Haacke se
aproximam do pensamento sociológico, especialmente do autor Pierre
Bourdieu para refletir sobre o que é instituição e questioná-la.
Mas enquanto no período dos anos 1970, a preocupação dos artistas
que iniciam a pesquisa institucional em suas práticas se dá em uma
dimensão de desvelamento da instituição-arte, de abertura de suas
entranhas e estruturas discursivas, da revelação de sua relação
com outras instituições sociais, nas práticas latino-americanas, o
engajamento das instituições-arte no questionamento das
instituições políticas e econômicas que provocavam a repressão,
o medo, a desigualdade e a morte tomavam a dianteira em algumas ações
de questionamento institucionais.
O
fato de Fiat
Lux ter
duração de apenas um dia
também é importante para analisar o contexto da prática de Crítica
Institucional engendrada por esse trabalho. Pensando em outros
trabalhos realizados nessa época, a questão da efemeridade e
precariedade era evocada como dispositivo crítico das instituições
e de sua dimensão de reificação do objeto artístico.
Um
trabalho exemplar desse tipo de prática a que me refiro é o
realizado em 1973, pelo artista Antonio Manuel. Ele propôs a mostra
De
0 a 24 horas, uma
exposição que se realizou no suplemento cultural de domingo de O
Jornal
(periódico carioca da época). Inicialmente pensada para ser
realizada no MAM do Rio, a mostra foi cancelada e o artista resolveu,
então, fazê-la no jornal, veículo de massa e de grande circulação,
no qual, imaginou, ampliaria o alcance e o caráter provisório da
mostra. O caráter de crítica à instituição aqui ressaltado fica
evidente no texto de abertura do suplemento, citado no trabalho de
Artur Freitas (2007), o qual dizia:
Está
esgotado o ciclo das artes plásticas em galerias, em museus; se a
arte, essencialmente,
deve estar voltada para o público, para a massa, só terá sentido
se feita através de um veículo de massa, de comunicação de massa.
A partir dessa premissa, resolveu ele [Antonio Manuel] cancelar a
exposição que deveria ter sido aberta anteontem no Museu de Arte
Moderna do Rio, para que um jornal - O JORNAL, no caso - fosse a
exposição. Um jornal-exposição. Uma exposição que só dura 24
horas, o tempo que dura um jornal nas bancas. É essa
a
proposta de Antonio Manuel. Que O JORNAL
transmita ao
público. Para que
ele decida.
(FREITAS,
2007:162)
Afirmar
a precariedade, como ressaltado na frase “uma exposição que só
dura 24h, o tempo que dura um jornal nas bancas”, parece algo
fundamental ao dispositivo crítico-poético dessa obra. A evidente
crítica à instituição como local inadequado à existência, à
vivência e à experiência com a arte é ressaltado, dando lugar a
um outro dispositivo para realizar a exposição em que o contato
desta com o público ocorresse de maneira mais direta e ampla. O
museu não é lugar da massa, parece distanciado desta. O jornal,
assim, poderia fazer a mediação que a instituição não consegue,
ao mesmo tempo que teria a efemeridade inerente a ele (que é
descartado após ser lido). O museu reificador, distanciado e
estático é negado aqui em prol de um lugar mais dinâmico, amplo e
efêmero para a exposição.
A
questão da efemeridade está presente em Fiat
Lux
também, porém, diferente de 0
a 24h,
não busca outro meio para realizar a exposição como forma de
operar a crítica. Se no caso de Manuel, a censura à mostra no MAM
(o seu cancelamento), o levou a realizá-la por outros canais,
Meireles insistiu na procura por uma instituição para realizar Fiat
Lux. Não
teria sentido para este trabalho se realizar em outro lugar. Porque é
dentro do espaço expositivo que Meireles quer operar a sua crítica.
O espaço institucional é como mais um elemento, e um dos mais
importantes, para a compreensão desse trabalho. E o fato de o
trabalho durar apenas um dia é outro fator importante no jogo posto
em movimento por ele: não se trata de uma exposição artística
qualquer, não se trata da mera apresentação de um trabalho
artístico, ele é uma ação. E por ser assim, não quer estar preso
ao tempo da instituição, não quer se congelar nele. O seu efeito é
de impacto e precisa do tempo para funcionar. O tempo curto, efêmero
e passageiro da performance.
Os
trabalhos de um grupo de artistas brasileiras do período do fim dos
anos 1960 e década de 1970 foram denominadas pelo crítico Fernando
Morais como arte de guerrilha. Muitas ações e trabalhos desse
período primavam pelo acentuado tom político, pela inserção nos
sistemas de circulação de informações, pela precariedade e
efemeridade. A ação de guerrilha é rápida. Tem que possuir uma
intensidade de provocação de ruído forte, pois ela tende a
desaparecer sem deixar rastro. Assim são classificados trabalhos
como Trouxas,
de
Artur Barrio (trouxas de carne que eram espalhadas por locais como
beiras de rio em Belo Horizonte) ou Inserção
em Circuitos Ideológicos – Projeto Cédula, de
Cildo Meireles (notas de cruzeiro carimbadas com a pergunta Quem
Matou Herzog?). Na
arte de guerrilha, a ação é o forte, o jogo sígnico posto em
movimento entra em ação no conflito com o sistema oficial de
reprodução de informações, mas precisa fazê-lo de modo
sorrateiro para não ser eliminado.
No
trabalho Fiat
Lux,
pode ser possível encontrar elementos dessa ação de guerrilha
segundo a define Moraes. É uma exposição pensada para durar apenas
24h. É uma ação, mais do que a produção de uma escultura
permanente, mesmo que elementos escultóricos – especialmente
construtivos – sejam explorados no trabalho. É um jogo sígnico de
contra-informação, visto os elementos políticos que evoca na
relação estabelecida entre as partes do trabalho (os seguranças
com cara de polícia à paisana, a insegurança que eles promovem ao
andar sobre a lixa, a capacidade explosiva do cubo de fósforo, etc).
E se pensarmos na instituição como sendo, também ela, um sistema
de circulação de informação, este trabalho é uma intervenção
nesse sistema, visto que insere nele, como um ruído, uma série de
questionamentos sobre violência, legalidade e ilegalidade, repressão
e explosão.
Desse
modo, podemos afirmar que Fiat
Lux
opera um ação de Crítica Institucional à brasileira no sentido de
que põe em movimento uma série de elementos contextuais e
específicos da produção artística do período e estabelece com a
instituição relações que são distintas daquelas estabelecidas
por artistas como Hans Haacke, por exemplo. O enfoque ideológico, a
tentativa de promover o engajamento da instituição em uma crítica
política mais ampla, a efemeridade, todos são elementos marcantes
deste trabalho que promove uma Crítica Institucional
político-ideológica. Contaminação da instituição mais do que
desvelamento de suas estruturas; questionamento de seus elementos
ideológicos que coaduna com a tentativa de engajar a instituição
na crítica política.
6Cildo
Meireles, O Sermão da Montanha: Fiat Lux,
1973-1979,
superfície de 60 metros quadrados, rodeada por oito espelhos de
1,60m x 1,20m, oito versículos do sermão da montanha (Mateus 5,
3-10), 126 mil caixas de fósforo, lixa negra, cinco atores.
7Felipe
Scovino, Negócio Arriscado: dispositivos pra
um circuito da ironia. In:Revista
Poiésis, n 13, p. 159-172, Ago. de 2009
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